Em Abril de 1993 editava-se o Número 2 do Garganta de Loriga. Apesar do nosso amadorismo e da escassez de meios, conseguimos fazer um jornal. A vontade foi mais forte que as dificuldades e a persistência superou todas as divergências.
O facto é que, passados quase 20 anos ele continua vivo e a cumprir a sua tarefa de unir os Loriguenses espalhados pelos quatro cantos do mundo.
Mas... esta introdução, vem a propósito duma rúbrica que na altura havia no jornal e na qual publiquei uma história um tanto rocambolesca. A rúbrica chamava-se "Recordando" e a história tinha por título: 1939 - O ano em que não houve festa...
Remexendo no meu arquivo de jornais (guardo exemplares desde o nº Zero, publicado em Junho de 92), encontrei esta história que não resisto a publicar na íntegra.
Foto: João Carreira
Na nossa procura de curiosidades do passado de Loriga, fomos encontrar um documento muito intrigante, do qual publicamos uma cópia.
Tal documento, havia sido enviado pelo Bispo da Guarda ao, então, Pároco de Loriga, Revº Pe. Lages, com data de 7 de Agosto de 1939.
Dizia o seguinte:
Revmº Sr. Pároco de Loriga:
Revmº Sr. Queira dizer-nos:
1º - O que se passou na noite de Sábado último?
2º - O que resolveram: fizeram ou não a festa religiosa?
3º - Justifiquem o que tiverem feito.
4º - Será preciso interditar os promotores do que se fez? Houve realmente promotores? E quantos?
Deus guarde Vª Revª
Guarda, 7 de Agosto de 1939
Assinado - José, Bispo da Guarda
Documento enviado pelo Bispo D. José ao Revº Pe. Lages
O que nos chamou à atenção, foi, de facto, o 4º ponto desta carta, onde se pergunta se é necessário interditar os promotores.
Decidimos, então, investigar e aqui vos damos conta do que descobrimos.
Antes de mais, convém dizer que, na altura, não eram permitidos arraiais populares nas festas de cariz religioso.
Assim, alguns dos nossos conterrâneos que não se conformavam com tal proibição, decidiram reagir. Se bem o pensaram, melhor o fizeram.
Na noite anterior à Festa da Nª Srª da Guia (a noite de Sábado último a que se refere a missiva), por volta da meia-noite, os "promotores" dirigiram-se para o recinto da festa e, segundo algumas fontes, lançaram foguetes para captar a atenção da população, para que esta ouvisse os seus protestos. Ao que soubemos, aproveitaram, também, a ocasião para dirigirem alguns insultos ao Pároco.
Para se fazerem ouvir, utilizaram um grande funil, que foi, posteriormente, destruído pelo seu dono, ainda vivo, que nos confessou tê-lo feito para não ser incriminado.
- Não tive nada a ver com aquilo! Se soubesse o que iam fazer, nunca o tinha emprestado.
Mas o episódio não acaba aqui.
No dia seguinte, o Sr Pe. Lages recusou-se a fazer a festa.
Segundo as nossas fontes, justificou o facto, dizendo que não havia condições para a fazer, uma vez que os quatro indivíduos se propunham realizar um arraial no recinto (que acabaram por fazer), sabendo, de antemão, que tal não era permitido.
Assim, não se realizou a festa da Nª Srª da Guia, nesse ano, na data habitual, o 1º Domingo de Agosto.
Consta que, 15 dias depois, houve uma celebração na capela, ao que parece, em substituição da festa.
E os quatro "promotores" foram alvo de interdição (para o povo foi excomunhão), por parte do Bispo da Diocese.
Nos dias de hoje, este episódio pode causar alguma perplexidade e até alguma graça, mas, na época, estas coisas das excomunhões eram levadas muito a sério por parte das populações, muito dependentes da autoridade religiosa.
A titulo de exemplo, note-se que o Pe. Lages era o Presidente da Junta Paroquial de Loriga, entidade semelhante à actual Junta de Freguesia.
1 comentário:
Ora aqui está uma história que não conhecia...
E tem graça a carta do bispo, fazendo perguntas para as quais, certamente, tinha respostas. Porque alguém se adiantou, "bufando", à eventual explicação que, admito, o Pe Lages lhe faria chegar.
Eram os tempos...
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